Jeremias Macário: a primeira parte do artigo “Uma história hilária do Frei Cisco e outras”

Foto: BLOG DO ANDERSON

Jeremias Macário | Jornalista | [email protected]

Muito tempo atrás um velho Griot reuniu sua gente na cabana da sua aldeia e contou para seus filhos, netos e bisnetos uma história hilária que se passou no reino de Bacu. Era uma vez um líder dos trabalhadores da grande cidade conhecido pelo nome de Frei Cisco, vindo com seus irmãos de uma longínqua terra, árida agreste e seca, muito pobre até hoje. Fugidos da fome e da exploração dos senhores proprietários, mãe e filhos vieram batendo poeira pelas estradas num Pau-de-Arara, tipo de transporte mais usado naquela época. Entre todos, o irmão de apelido “Gula” era o mais esperto e bom vivan que gostava mesmo era de curtir os botecos e contar causos da sua região do seu povo sofrido, dos coronéis e jagunços valentões. >>>>>|>>

   Não gostava lá muito de trabalhar, mas seu jeito popular desembaraçado de falar, com eloquência, desenvoltura e convencimento, encantava a todos que o ouviam. De bom papo, aonde chegava eram abraços e a conversa era bem animada. Frei Cisco viu no irmão um grande dote para comandar o movimento dos operários e o convidou para um tal de sindicato, mas ele logo resistiu. Não queria se meter em confusão, nem tampouco tomar seu tempo de porres para resolver problemas dos outros.

  Depois de muita insistência, “Gula” aceitou participar da organização trabalhista e tomou gosto pela atividade, tanto que logo virou dirigente e passou a atrair companheiros com seus discursos inflamados, decretando greves contra o patronado. O reino de Bacu vivia uma terrível ditadura lá pelos anos 70 e 80 e mandou prender “Gula” que, àquela altura, já estava escolado em negociações e outras malandragens.

   Solto, correu o reino, fez caravanas refazendo todo seu caminho de origem pregando justiça, ética, honestidade e com a promessa de não se misturar com os maus. Perdeu o reino, mas com os ensinamentos do marqueteiro astuto por nome “Buda”, espalhou bondade e, em pouco mais de 10 anos de pleitos, “Gula” se tornou rei de Bacu, depois de ter feito acordos espúrios com o capital e personagens mais nefastas da nobreza, gente da escória que vivia de saquear os bens da pobre rica coroa. Frei Cisco perdeu prestígio, caiu em desgraça e no esquecimento, enquanto “Gula” se deleitava e se lambuzava com o poder.

  O rei escolheu “Jô Someu” como seu fiel escudeiro, conselheiro-despachante mor, tipo Rasputin feiticeiro engenhoso, temido por toda a corte. “Todo rei tem seu feitor”. Os dois abriram concessões ao capitalismo, mandaram fazer programas sociais assistencialistas, abriram Bolsa Família para matar a fome dos pobres e criaram um “mensalão”, espécie de agrado em dinheiro para seus reis, duques e valetes de espada, para manter o poder sem ameaças de fora.

  Ricos e pobres ficaram contentes e todos aplaudiram o esquema. Tudo ia bem quando descobriram a tramoia do “Mensalão” e um seu aliado de nome “Trovão” botou a boca no trombone. Foi um fuzuê danado no reino, mas “Gula” logo livrou a cara dizendo que nada sabia. Tinha traidor na sua camarilha. Mandou “decapitar”. Outros foram para a “forca”.

  A lambança dos aloprados rendeu a prisão de muitos nobres e lordes, mas entre feridos e expurgados, o rei se salvou da tormenta. Pelas mãos do novo mago marqueteiro “Raspadinhas”, os súditos votaram no rei “inocente” que ficou ainda mais forte e com superpoderes. O homem se fez até de Cristo.

  Em meio a tantas farturas, fortunas e gastanças, todos felizes em festas e farras, lá um dia o rei lembrou do seu irmão Frei Cisco que precisava de uma ajudinha para ter suas mordomias e fazer suas farrinhas. Afinal de contas, o homem também era filho de Deus.

  Ai o rei “Gula” pediu uma mesada para seu velho irmão ao grande chefe todo poderoso, dono da empreiteira “Odeflechet”, chamada pelos índios de a “Grande Montanha”. Aproveitou também para pedir para seus filhos, outros parentes e amigos.

   O chefe da grana disse: Eu ajudo seu filho e você ajuda o meu. Tudo combinado. O Frei Cisco que nunca fez voto de pobreza, vendo tantas facilidades, cobrou logo um reajuste de quase 100% da sua mesada. Indagado sobre a mesada ao seu irmão, o ex-rei simplesmente respondeu que a “Grande Montanha” deu por que quis. Certamente Frei Cisco é um “monge” muito bondoso e caridoso com os pobres.

  Entre idas e vindas, rachas e trapaças, o sistema de propinas continuou correndo solto, agora através da “Bacubrás”, a joia da coroa produtora de petróleo. Um dia apareceu um juiz da corte de nome “Touro Duro” e com uma operação denominada de “Leva Rato” desbancou toda farsa e saiu prendendo gente graúda.

 


Os comentários estão fechados.