Romélia Lessa: Câncer de mama, medo e-ou preconceito

Foto: Divulgação
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Romélia Lessa | Advogada | romelialessaadv1@gmail.com

“Conheça todas as teorias, domine todas as técnicas, mas ao tocar uma alma humana, seja apenas outra alma humana.” Carl Gustav Jung.

Ainda hoje é possível observar um grande temor social pelo simples fato de pronunciar a palavra “câncer”, como se esse fosse o fator causador da enfermidade. Mais velho que o Profeta Moisés, o provável primeiro registro sobre o câncer de mama é datado em 2.500 a.C. por sacerdote egípcio Imhotep ao descrever uma “massa protuberante no seio”. É inegável que nós, mulheres, somos as maiores vítimas de neoplasia maligna na mama, o que amedronta a comunidade feminina desafia os cientistas no mundo todo em busca da cura para o câncer de mama. Embora a doença seja uma moléstia grave e requeira cuidados, além da doença em si, outro fato que aflige a maioria das mulheres ao longo do  tratamento é a mutilação. Leia o artigo na íntegra.

A mastectomia é o tratamento mais utilizado para o câncer de mama e provoca uma série de perturbações nos sentimentos o que pode resultar em traumas para saúde psíquica da mulher e consequentes fragilidades nos enfrentamentos diários.

Existe no inconsciente da mulher que sua  feminilidade  está diretamente ligada ao seu corpo, pois é nele que está depositado o encargo de despertar a construção da autoimagem, autoestima e a definição de sua individualidade, todavia a retirada da mama motiva a ocorrência de sentimentos negativos como a vergonha, rejeição e inferioridade na maioria das mulheres.

O seio feminino é tido como parte do corpo responsável pelo desejo e satisfação, e o aparecimento de uma doença nesta região do corpo ameaça todas as possibilidades de simbolização de poder da  mulher enquanto ser feminino. Com a possibilidade real de perder  a mama, permeia na mente da mulher o questionamento de sua identidade feminina, bem como a sua capacidade para a amamentação e sua sensualidade.

 Arraigada por uma cultura machista existe uma premissa na qual a mulher não foi e ainda não é educada para ter prazer, o que normalmente a menina descobre sozinha na adolescência ou tardiamente na idade adulta, quando desperta para se reconhecer como ser capaz de ter sensações agradáveis e saudáveis que seu corpo lhe proporciona. Em decorrência dessa cultura de punição ao toque no próprio corpo, grande parte das mulheres não faz o autoexame e a doença muitas vezes é descoberta já em fase avançada.

No Brasil, em 2016, são esperados 57.960 casos¹ novos câncer de mama, com um risco estimado de 56,20 casos a cada 100 mil mulheres, sendo a maior causa de morte por câncer em mulheres no Brasil. A Secretaria de Saúde do Estado da Bahia (SESAB) ²registrou 540 óbitos por neoplasia maligna da mama no sexo feminino. Constam nos registros da secretaria 1.490 internações por câncer de mama neste ano até o final de setembro de 2016.

No Brasil temos várias leis que asseguram os direitos  às pessoas com câncer, deste modo é de suma importância que busquem informações para validação de seus direitos. A exemplo, a pessoa com neoplasia maligna tem garantido o primeiro tratamento pelo Sistema Único de Saúde – SUS no prazo máximo de até 60 dias a partir da certeza do diagnostico (Lei 12.732 de 22/11/2012). Possuem também direitos sociais como sacar o FGTS, PIS, isenção de IPI para carros adaptados, isenção de IRPF na aposentadoria além de vários outros.

Em caso do câncer de mama, a Lei 9.797/1999 dispõe sobre a obrigatoriedade da cirurgia plástica reparadora da mama pela rede de unidades integrantes do SUS nos casos de mutilação decorrentes de tratamento de câncer. Entretanto, a precariedade do sistema de saúde pública tem déficit que vai da falta de centro cirúrgico ao reduzido número de médicos especializados para fazer a cirurgia de reconstrução, que deve ser realizada pelo cirurgião plástico ou mastologista. Segundo dados da Sociedade Brasileira de Mastologia, cerca de 20 mil mulheres que precisam fazer cirurgia de retirada das mamas, menos de 10% saem dos centros cirúrgicos com os seios reconstruídos, mas a lei continua a garantir a reconstrução após a recuperação do procedimento cirúrgico, conforme Lei 12.802/2013.

A situação é complexa, perpassa por confrontos entre as garantias legais, de difícil decisão para equipe médica que precisa optar em fazer a mastectomia ou a reconstrução da mama diante da falta de salas cirúrgicas. O sistema garante, mas os direitos dos cidadãos são pouco a pouco mitigados e assim, em condições instáveis de funcionalidade real torna o serviço precário, de baixa abrangência e acima de tudo, que não favorece a saúde da mulher mastectomizada.

Por fim, o importante aqui é alertar as mulheres para o autocuidado, encorajando-as a conhecer seu corpo, enfrentando todos os medos e tabus e se tocarem.  Ademais, é possível levantar o questionamento sobre esse acervo de problemas intrínsecos à prestação de serviços e ao cuidado e acolhimento às mulheres mastectomizadas.

Comprometa-se e Vença suas próprias atitudes!

¹Fonte:http://www.inca.gov.br/estimativa/2016/sintese-de-resultados-comentarios.asp

² http://www.tribunadabahia.com.br/2015/09/29/cancer-de-mama-ja-matou-540-mulheres-este-ano-na-bahia

Romélia Lessa – Advogada especialista em Direito Médico – romelialessaadv1@gmail,com


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