Jeremias Macário: A sagrada carteira que é já teve valia e os caloteiros da terceirização

Foto: BLOG DO ANDERSON

Jeremias Macário de Oliveira | Jornalista | [email protected]

Foi-se o tempo em que ter uma Carteira do Trabalho era uma honra para o trabalhador brasileiro que sempre carregava a digníssima no bolso com segurança para comprovar nas batidas policiais que não era um vagabundo qualquer.  Hoje com a crise econômica, o desemprego e a reforma trabalhista que escravizou de vez a mão-de-obra, ela anda saudosista amarelada pelos cantos, e o seu dono cabisbaixo se sujeitando às negociatas opressoras do patrão, para não morrer de fome. Quando demitido aceita acordos de conciliação sem antes passar pela rescisão como ainda manda a lei. Leia a íntegra.

  A grande maioria dos ativos aptos a trabalhar está na informalidade fazendo bicos pelas ruas para levar um pouco de comida para casa. Só em janeiro deste ano mais de dois milhões entraram no mercado informal se somando a outros milhões de invisíveis às leis e aos direitos trabalhistas. Mais de 80% desconhecem os termos da nova reforma.

  A pobre da Carteira, que já foi símbolo de autoestima, perdeu sua valia. Como agora o negociado está acima do legislado num país de 13 milhões de desempregados e de profundas desigualdades sociais de famintos, o capital ganancioso e concentrador de renda dita suas normas.

   Do outro lado do balcão, humilhado e desprezado, o escravo operário é obrigado a aceitar tudo calado se quiser comprar um pedaço do caro pão para seus filhos. Existe ainda a figura do intermitente, aquele coitado avulso que só é chamado de tempos em tempos para mais um serviço. Dele extrai o rentável lucro fácil, sem gastos adicionais de adicionais  trabalhistas.

  As férias foram esquartejadas, e o décimo terceiro profanado em pedaços. O santo labor do suor derramado com sacrifício foi prostituído. Tem empresa que deixa o empregado acumular várias férias por mais de dois anos e, para disfarçar de uma fiscalização que não mais existe, manda o serviçal trabalhar sem bater o ponto. Acabou o sagrado descanso.

 No lugar da dor física e moral do chicote do senhor no lombo até abrir a carne em sangue do negro africano, criaram o mourão da reforma trabalhista do Brasil “moderno” onde só existe o poder de barganha do lado capitalista burguês. Embora com outros métodos disfarçados de bater e castigar, a dor no corpo e na alma em chagas continua intensa e dolorida. O psicológico sente-se destruído pela envergadura da exploração.

 Toda classe empresarial apoiou e bateu palmas, mas a reforma é um tiro no pé no propósito intencional do governo de aumentar a arrecadação da previdência social, sem contar o tempo maior que o trabalhador terá que arcar para se aposentar. Além de ser um engodo, é um instrumento das elites para o emprego de uma mão-de-obra barata e escrava. Existe ainda a rotatividade permanente para contratar outro profissional por salário mais baixo ainda e burlar a Justiça, como tem feito os oportunistas de plantão.

    Como aprovada pelo Congresso Nacional, a reforma é para países do Reino Unido, da França e da Alemanha que têm economias sólidas, menos desigualdades, sindicatos fortes e leis judiciais punitivas, não para o Brasil, Bangladesch e outros países pobres onde o trabalho não tem quase nenhum poder de negociação com o capital.

  Aqui, com poucas exceções, os sindicatos, embora muitos e até demais, têm pouca representatividade perante sua categoria. A maioria das entidades é “dirigida” por aventureiros e aproveitadores que estão mais preocupados com seus interesses políticos e econômicos.

OS CALOTEIROS

  Num país onde a justiça é lenta e as leis repletas de brechas e interpretações variadas, a terceirização amplia o cativeiro em todos os segmentos da empresa, seja pública ou privada. Nela os caloteiros das contratações de serviços encontraram um terreno fértil para suas ações criminosas de ganhar muita grana, com remuneração bem mais baixa. Por pura necessidade, até pessoas qualificadas entram nesse alçapão.

  Aqui mesmo em Vitória da Conquista e na Bahia são inúmeros os exemplos de atrasos no pagamento dos salários e do não cumprimento das obrigações trabalhistas por parte das terceirizadas, verdadeiras arapucas armadas para explorar o trabalhador. Sem dinheiro e desempregadas, muitas famílias penam e passam apertos na mão desses caloteiros.

  O pior é que quando isso acontece, o trabalhador fica no jogo de empurra entre a empresa ou órgão onde ele atua e o terceirizado, o qual alega não repasse dos recursos do contratado. Falta de gestão ou trambique mesmo, o certo é que sobra para o pobre coitado que fica sem receber. A Justiça, a Defensoria e o Ministério Público quase nada fazem.

   Tem terceirizado que ainda subcontrata o serviço, e muitos, para driblar qualquer tipo de punição judicial de cobrança, compra bens móveis e coloca em nome de parentes e amigos, sumindo com a verba recebida da empresa contratante. Aí o trabalhador fica a ver navios e a chorar sozinho sua dor.


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