Matheus Souza: 28 anos do Código de Defesa do Consumidor e direitos ainda desconhecidos

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Matheus Silva Souza | Advogado | [email protected]

Um dos mais importantes instrumentos normativos no ordenamento jurídico brasileiro, a saber, o Código de Defesa do Consumidor – CDC completa 28 anos de vigência no Brasil. É dizer, que no dia 11 de setembro de 1990 foi promulgada a Lei 8.078/90 que entrou em vigor no dia 11 de março de 1991, inserindo no ordenamento jurídico brasileiro uma política nacional para relações de consumo. Antes disso, os problemas no relacionamento entre consumidores e fornecedores de bens e serviços eram dirimidos pelo Código Civil, que se mostrava insuficiente para dar conta dos fenômenos cada vez mais sofisticados e dinâmicos decorrentes da moderna sociedade de consumo. >>>>>>

Ao contrário do que ocorre com muitas leis no Brasil, o CDC não é uma lei simbólica, ao revés, está presente no dia a dia do consumidor, sendo inclusive de fácil acesso.

Com efeito, segundo os comandos da Lei no 12.291/10, os estabelecimentos comerciais e de prestação de serviços são obrigados a manter, em local visível e de fácil acesso ao público, 1 (um) exemplar do Código de Defesa do Consumidor, sob pena de aplicação de penalidade pela autoridade administrativa.

Ocorre, que muitos cidadãos, contudo, ainda têm dificuldade para compreender certos direitos e princípios contidos nele. Com vistas, a facilitar o entendimento, reunimos, uma síntese de 10 (dez) direitos, provavelmente desconhecidos de muitos consumidores.

1 – COBRANÇA INDEVIDADE E DEVOLUÇÃO EM DOBRO: Nos termos do Art. 42 do CDC o consumidor não inadimplente não será exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça, e se for cobrado por quantia indevida, terá direito que lhe seja devolvido em dobro e corrigido;

  • – PRAZO PARA RETIRADA DO NOME DO CONSUMIDOR DOS ÓRGÃOS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO: Segundo a jurisprudência pacífica do STJ, mesmo havendo regular inscrição do nome do devedor em cadastro de órgão de proteção ao crédito, após o integral pagamento da dívida, incumbe ao credor requerer a exclusão do registro desabonador, no prazo de 5 (cinco) dias úteis, a contar do primeiro dia útil subsequente à completa disponibilização do numerário necessário à quitação do débito vencido;

  • – SUSPENSÃO DE SERVIÇOS SEM CUSTOS: O consumidor que pretende fazer a suspensão de um serviço em razão de ausência domiciliar, mesmo que temporário, a exemplo de férias. O consumidor tem o direito de suspender, uma vez por ano, serviços de TV a cabo, telefone fixo e celular, sem custo. No caso do telefone e da TV, a suspensão pode ser por até 120 dias. Os Serviços de água o prazo pode ser negociado com a concessionária, mas há cobrança para a supressão e para a religação do serviço, e, no caso de Energia Elétrica, não existe prazo máximo, porém é recomendável verificar com a concessionária responsável;

  • INDENIZAÇÃO POR ATRASO NA ENTREGA DA OBRA: Os Tribunais Superiores entendem, que quando há atraso na entrega da obra, e desde que comprovado danos a personalidade, é devido pela construtora, indenização por danos morais ao consumidor, bem como danos materiais, a título de lucros cessantes;

  • AUSÊNCA DE VALOR MÍNIMO PARA COMPRAS COM CARTÃO: Os estabelecimentos comerciais, não podem exigir um valor mínimo para o consumidor pagar a compra com cartão. Se a loja aceita cartão como meio de pagamento, deve aceitá-lo para qualquer valor. A compra com o cartão de crédito, se não for parcelada, é considerada pagamento à vista. Cobrar mais de quem paga com cartão de crédito fere o inciso V do artigo 39 do CDC (Código de Defesa do Consumidor), que classifica como prática abusiva exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva;

  • DESISTÊNCIA DE COMPRAS PELA INTERNET OU TELEFONE: O art. 49 do CDC diz que o Consumidor pode desistir do contrato, no prazo de 7 dias a contar de sua assinatura ou do ato de recebimento do produto ou serviço, sempre que a contratação de fornecimento de produtos e serviços ocorrer fora do estabelecimento comercial, especialmente por telefone ou a domicílio. Portanto, Quem faz compras pela internet e pelo telefone pode desistir da operação, seja por qual motivo for, sem custo nenhum, em até sete dias corridos;

  • GARANTIAS E PRAZOS: Segundo o Código de Defesa do Consumidor o fornecedor deve responder por defeitos de fabricação – até mesmo fora do período de garantia. Os fornecedores respondem pelos defeitos de qualidade ou quantidade que tornem produtos inadequados ao consumo ou diminuam seu valor. Quando se tratam de problemas aparentes (ou facilmente perceptíveis) em serviços ou produtos não duráveis, o consumidor tem até 30 dias para fazer sua reclamação. Em contrapartida, quando se tratam de produtos duráveis, esse prazo é de até 90 dias.
    A situação se torna mais polêmica quando se trata dos chamados “vícios ocultos”, ou seja, defeitos que não são facilmente identificados e podem demorar anos para se manifestarem. O Art. 26, § 3º do CDC deixa claro que o consumidor tem direito à reparação de falha oculta até o fim da vida útil do produto e não apenas durante o período de garantia. O prazo para reclamação começa a contar a partir do momento em que o defeito de fabricação foi evidenciado;

  • RESPONSABILIZAÇÃO DO ESTABELECIMETO POR ACIDENTES EM SEU INTERIOR: Caso algum cliente venha sofrer qualquer tipo de acidente ou incidente (por exemplo, queda, furto, etc.), no interior de um estabelecimento comercial, banco, shopping center, etc. poderá pedir reparação de danos. Exemplifica-se com uma queda de um cliente devido o piso escorregadio ou molhado no interior de uma loja, gerando lesões com a queda, poderá requerer indenização. Vale salientar, que o STJ entende, que nesses casos, a responsabilidade do estabelecimento comercial é objetiva, ou seja, não é nem necessário provar a culpa do estabelecimento: a responsabilidade pelo fato é do fornecedor de serviços (artigo 14 do CDC), que foi negligente e causou um dano ao consumidor;

  • COBRANÇA DE CONSUMAÇÃO MÍNIMA É ABUSIVA: Segundo o comando inserto no art. 38, inciso I do CDC É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas, condicionar o fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos. O referida artigo, veda a famigerada “venda casada”, prática também, não raro, perpetrada pelos Bancos. É dizer, que um estabelecimento não pode obrigar que alguém consuma, seja em bebida ou em comida, um valor mínimo exigido previamente como condição de entrada ou permanência no estabelecimento, ou então, exigir o pagamento mesmo sem ter consumido qualquer produto. Nessa mesma, linha, aproveitamos para alertar que a taxa de 10% (dez por cento) ou a gorjeta do garçom, é uma faculdade, ou seja, o consumidor que irá optar por pagar ou não, bem como, é ilegal a multa por perda da comanda, vez que, o controle do consumo realizado nos estabelecimentos comerciais é de inteira responsabilidade do próprio estabelecimento, jamais dos clientes. Por fim, repisa-se, que a cobrança da chamada “consumação mínima” é uma prática corriqueira, porém, abusiva;

  • PREJUÍZOS CAUSADOS EM ESTACIONAMENTOS (GRATUITOS OU PAGOS): Da interpretação conjunta do art. 6°, inciso VI e artigo 14, § 1°, ambos do CDC, extraímos que a responsabilidade por qualquer dano ou prejuízo no veículo ou em seu interior é de total responsabilidade do estacionamento, seja em um estabelecimento que oferta estacionamento gratuito ou em estacionamentos particulares. Salienta-se que aquela famosa placa, que não raro, os consumidores se deparam em estacionamentos: “Não nos responsabilizamos por objetos deixados no interior do veículo“, é abusiva e ilegal! A partir do momento em que o consumidor entrega a chave do carro para o manobrista ou retira o tíquete do estacionamento, a responsabilidade é transferida à empresa de estacionamento, que deverá responder pela segurança do carro durante a permanência no local, garantir a incolumidade e a segurança do bem do consumidor, reparando eventuais prejuízos.

É de todo oportuno trazer à lume, que em 2009 foi publicada a Lei n° 11.975, com o mesmo espírito do CDC, visando regulamentar o direito do consumidor que utiliza transporte coletivo rodoviário. Nos termos da lei supracitada, os bilhetes de passagens adquiridos para transporte coletivo rodoviário de passageiros intermunicipal, interestadual e internacional terão validade de 1 (um) ano, a partir da data de sua emissão, independentemente de estarem com data e horários marcados, ou seja, caso o consumidor não consiga fazer a viagem na data marcada, o passageiro deve comunicar a empresa com até três horas de antecedência. Depois, poderá usar o bilhete em outra viagem, sem custos adicionais, mesmo se houver aumento de tarifa.

Vale ressaltar, que alguns consumidores, mesmo tendo conhecimento de alguma prática abusiva ou ilegal, acabam por não buscar seus direitos para evitar desgastes, constrangimentos e perda de tempo com a tentativa de resolver o impasse junto à Empresa diante da burocracia imposta. Porém, essa omissão do consumidor, traduz em uma anuência com a violação dos seus direitos, deixando a empresa que pratica a ilegalidade em uma situação cômoda, para, inclusive, continuar a praticando as abusividades. É preciso alertar também, que as decisões administrativas e judiciais, que visam coibir condutas ilegais de violação ao direito do consumidor tenha um caráter pedagógico, com vistas a coibir a reincidência do ato abusivo pela empresa.

Destarte, é notório o avanço na resoluções dos conflitos advindos das relações de consumo após a vigência do Código de Defesa do Consumidor, porém, em que pese a imposição de divulgação ao público, muitos consumidores ainda desconhecem os seus direitos, pelo que se faz necessário que o consumidor fique atento a eventuais violações, e procurem os órgãos administrativos competentes ou o Poder Judiciário, para ter resguardados seus direitos.

MATHEUS SOUZA

ADVOGADO

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