Jaime Lerner e Conquista 2040: Cidade para que (m)?!

Foto: BLOG DO ANDERSON

Claudio Carvalho[i]

A cidade poderá ser interpretada, vista e sentida de diferentes formas. As experiências de vida, o conhecimento de mundo, o local de moradia e trabalho, o meio de locomoção, são alguns dos fatores que interferirão na leitura desses espaços. Mesmo que atravessem as mesmas portas, as pessoas lançam seus olhares para diferentes janelas e constroem diferentes ideais de vida na cidade.  Vitória da Conquista é tida como um município que inovou na política nos anos 1980 e 1990, em relação à disputa e enfretamento com o carlismo e ao Orçamento Participativo (OP). Era de esperar, talvez, que o processo urbano evidenciasse isto; porém, o I Plano Diretor Urbano, de 1976, foi formatado por um modelo autoritário e tecnocrático e o II Plano Diretor, de 2007, se mostrou sinais de inovação democrática, ainda se revelam insuficientes. >>>>>

Segundo o site da Prefeitura Municipal de Vitória da Conquista (PMVC), o arquiteto curitibano Jaime Lerner, será o responsável pelo projeto conceitual do Parque do Rio Verruga. O Parque Ambiental do Rio Verruga foi oficialmente criado pelo Decreto nº 19.394, assinado pelo prefeito Herzem Gusmão no dia 5 de abril deste ano. O Parque tem a proposta de preservar os ecossistemas naturais de relevância ecológica para o município, permitindo ainda a criação de um espaço de lazer e interação para os conquistenses. Segundo site da PMVC: “O Parque Ambiental faz parte do Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano (PDDU), executado em parceria com a Fundação Escola Politécnica da Bahia (FEP)” (http://www.pmvc.ba.gov.br/prefeito-assina-decreto-que-cria-o-parque-ambiental-do-rio-verruga/). A FEP de Salvador está recebendo, sem licitação, um valor total de R$ 4.589.477,80 (quatro milhões, quinhentos e oitenta e nove mil, quatrocentos e setenta e sete reais e oitenta centavos) pela prestação de serviços de consultoria na elaboração do Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano e do Plano Diretor do Distrito Aeroportuário; Estudos para criação da Agência Reguladora Municipal; Revisão e atualização dos Termos de Referência para Plano Municipal de Saneamento Básico, Plano Municipal de Meio Ambiente e Plano Municipal de Mineração no município de Vitória da Conquista – BA (http://dom.pmvc.ba.gov.br/diarios/previsualizar/xoN8EbaZ/410). Falarei mais do PDDU atual e do processo de atualização em um próximo artigo.

Aqui interessa saber que a PMVC assinou, também sem licitação, contrato com a empresa Jaime Lerner que vai receber R$ 730.000,00, (setecentos e trinta mil  reais) pelo projeto (http://dom.pmvc.ba.gov.br/diarios/previsualizar/qdNK97jR/38?fbclid=IwAR29vIR4PGE0_Gq_G7mWoYPw_hoN9II20J7vWYpfLxeuJV0izIOxMGmR3cI ). Jaime Lerner mandou um recado para a cidade: “alô pessoal de Vitória da Conquista, daqui pra frente Vitória da Conquista será outra coisa, nós estamos assinando um contrato de execução de uma série de trabalhos que vão ajudar Conquista tomar outro rumo, o rumo do futuro”. (http://www.pmvc.ba.gov.br/prefeitura-assina-contrato-para-a-elaboracao-do-plano-conceitual-do-parque-ambiental-do-rio-verruga/).

Jaime Lerner foi prefeito de Curitiba por 3 vezes. É daí a fama de ser um grande urbanista. O que muita gente não sabe é que a cidade “modelo” de Lerner está no ranking das mais desiguais do mundo, segundo o relatório do Fórum Urbano Mundial da ONU (2010), demarcando territorialmente para separar pobres de ricos. Bosques, parques e belíssimos bairros em regiões nobres encantam quem chega para visitar. Já para quem mora e conhece bem a cidade, sabe que suas mazelas estão escondidas e esquecidas. A exclusão é demarcada territorialmente, onde pobres e ricos sequer se comunicam.

Sabemos que o sistema capitalista, se apropria da cidade, mercantiliza seus espaços e transforma a qualidade de vida em um bem de elevado preço, que poucas pessoas conseguem obter. A vida na cidade: habitação, saneamento básico, serviços de saúde e educação, lazer, trabalho e segurança pública, vira um sistema que costuma cobrar um preço para cada porta que se queira atravessar.

A realidade urbana é fluida. Ela é a todo tempo construída e reconstruída, a partir dos fatores econômicos, políticos e culturais que emanam do cotidiano social e pode ser interpretada e reinterpretada de acordo com as crenças e interesses que motivem os olhares. Por isto mesmo, as autoridades públicas, as representações privadas e a efetiva participação dos cidadãos influenciaram e influenciam de maneira distinta no processo de planejamento urbano de Vitória da Conquista.

Questões que precisam de respostas da Prefeitura Municipal, da Câmara de Vereadores e de outros atores: Qual a contribuição que Lerner com sua “experiência” pode nos ajudar em construir uma Conquista para 2040?! Não temos profissionais conquistenses para pensar a cidade?! Concurso, seleção, licitação é ficção para atual administração municipal?!

[i] Claudio Oliveira de Carvalho  e Doutor em Desenvolvimento Regional e Urbano. Mestre em Direito. Professor adjunto da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Urbanístico – IBDU. Coordenador do Grupo de Pesquisa Direito e Sociedade – GPDS. Integrante do Núcleo de Assessoria Jurídica Alternativa – NAJA. ccarvalho@uesb.edu.br


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