Benjamin Nunes | Luiz Gonzaga, o Rei do Baião

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Benjamin Nunes Pereira

Lula ou Lua o rei do baião como era popularmente conhecido o nosso Luiz Gonzaga do Nascimento, nasceu em Exu no dia 13 de dezembro de 1912. O lugarejo foi revivido anos mais tarde em “Pé de Serra”, uma de suas primeiras composições, ele teve uma passagem histórica e comovente por todos os lugares que passou, pois foi um compositor e cantor popular brasileiro. Hoje, 13 de dezembro dia Nacional do forró, dia de Santa Luzia, de quem era bastante devoto. Era filho do sanfoneiro Januário José dos Santos, que trabalhava na roça, num latifúndio e nas horas vagas tocava acordeão ou gaita como chamam os sulistas (também consertava instrumentos). Foi com ele que Luiz Gonzaga aprendeu a tocá-lo. A sua mãe chamava-se Ana Batista de Jesus ou, simplesmente Santana. Leia a íntegra.

Ainda não era adolescente Gonzaga, quando passou a se apresentar em bailes, forrós e feiras, de início acompanhando seu pai. Autêntico representante da cultura nordestina manteve-se fiel às suas origens mesmo seguindo carreira musical no Sudoeste do Brasil. O gênero musical que o consagrou foi o baião. A canção emblemática de sua carreira foi Asa Branca, que compôs em 1947, parceria com o advogado cearense Humberto Teixeira. Antes de completar dezoito anos Gonzaga teve sua primeira paixão enlouquecida por Nazarena, uma jovem de sua região. Porém, o pai dela, o coronel Raimundo Deolindo não aceitou esse namoro, pois não o queria para genro chegando até ameaçá-lo de morte. Devido sua maneira de ser firme e de grande coragem não se sentiu ameaçado e continuou a namorar com a moça Nazarena por algum tempo às escondidas e tinham como planos uma felicidade conjunta. Januário e Santana ao tomarem conhecimento do fato lhe deram uma surra, humilhado e ofendido o rapaz vendeu a sanfona arrumou a trouxa e partiu. Revoltado por não poder casar-se com a moça que ele tanto amava e não querer ser assassinado pelo pai dela, Gonzaga toma uma decisão vai embora de sua terra e se inicia na carreira militar no exército na cidade do Crato, Estado do Ceará, quando foi alistado no exército; durante um período de nove anos ele não deu nenhuma informação à sua família e viajou por vários estados brasileiros, como soldado. Não teve envolvimento com outras namoradas, então passou a ter algumas amantes ao longo de sua vida, como se diz na gíria hoje “ficantes”.

Um fato interessante é que em suas andanças pelo Brasil, em Juiz de Fora – Minas Gerais, conheceu um cidadão de nome Domingos Ambrósio, também soldado e conhecido na região pela sua habilidade como acordeonista. A partir desse momento começa a se interessar por esse instrumento musical, uma vez que, quando do seu ingresso no Exercito Brasileiro ele era corneteiro.

No ano de 1939, estava lotado no Rio de Janeiro, capital federal a época e deu baixa do exército, pois estava decidido a trabalhar na área musical. Então disposto a ganhar dinheiro, seu primeiro emprego na cidade foi no “mangue”, zona de meretrício, que na época, ao lado de casas de quinta categoria, mantinham botequins iluminados, de razoável aparência, com arrasta-pés vespertinos e música ao vivo. Seu repertório, então, era composto de tangos e boleros, valsas, foxtrotes. Uma bela noite, depois de ouvi-lo, um estudante pernambucano de passagem disse-lhe:

Você toca muito bem, seu moço. Mas por que não ataca umas coisinhas lá da nossa terra pra matar a saudade. Deixa o tango pra lá. Olha, da próxima vez que a gente vier aqui, se você não tocar umas músicas nordestinas, não vai ter dinheiro no seu pires.

Pensando em tudo aquilo, especialmente no dinheiro no pires, compôs dois chamegos, Pé de Serra e Vira e Mexe. Consciente de que o rádio era o principal veículo para a música naquele ano de 1941, inscreveu-se no programa de calouros de Ary Barroso, solou Vira e Mexe, ganhou o primeiro prêmio e, não muito depois, foi contratado pela Rádio Nacional.

O sucesso chegou rápido, a glória, a força do talento derrubando preconceitos e reabrindo as portas do meio musical para o esquecido Nordeste. Tanto assim, que em 1950, o baião já era tão ouvido no rádio quanto o samba, o bolero e os outros ritmos estrangeiros da moda. Muitos chegavam a pensar que aquela “nova dança” tinha sido inventada por Luiz Gonzaga e seus parceiros, o advogado cearense Humberto Teixeira (1915 – 1979) e o médico pernambucano José de Souza Dantas, o Zé Dantas (1921 – 1962). Com eles (e vários outros que se agregaram a ele) Gonzaga compôs uma obra que conjuga refinamento, popularidade e traça um painel da rica cultura desta parte do Brasil. Reunidos no escritório de advocacia do centro da cidade, num fim de tarde de 1945, que avançou noite adentro, Teixeira e Gonzaga tomaram a histórica e mercadológica decisão de utilizar o formato binário do baião, que os violeiros batiam no bojo da viola da cantoria, como ritmo nordestino mais palatável à massificação. De imediato acertaram logo no didático manifesto fundador, “Baião” (“Eu vou mostrar pra vocês/como se dança o baião/e quem quiser aprender é favor prestar atenção”), gravado inicialmente pelo grupo vocal Os 4 Ases e 1 Coringa, no ano seguinte. A voz anasalada e o canto chorado, “bluseiros” de Gonzaga enfrentaram certa resistência da gravadora, que tinha contratado inicialmente apenas como instrumentalista. Mas seu êxito autoral devastador (“Asa Branca”), “Paraíba”, “No Meu Pé de Serra”, “Qui nem jiló” o empurrou para frente dos microfones, palcos, grandes auditórios e, por fim, diante do povão aglomerado em torno dos alto-falantes das cidades do interior e das caravanas que levaram o astro a, literalmente, todos os cantos do país.

Poucos artistas conseguiram tal abrangência, diversificação de sucessos e durabilidade do conjunto da obra. Junto do baião, Gonzaga lançou o xaxado, xote, quadrilha, chamego, toada, forró e derivados que ia inventando. Também singrou gêneros de outras regiões como o calango, rancheira, mazurca e até os tradicionais samba e choro. Além da certeira aliança com poetas da terra, o músico Gonzaga foi responsável pela febre nacional da sanfona, instrumento que passou a ser obrigatório para candidatos a artistas. Marcou boa parte dos bossas-novistas e alguns pósteros, de Eumir Deodato (autor de “Baiãozinho”) e João Donato a Edu Lobo (um dos pais da vertente nordestina da bossa), Wagner Tiso e Milton Nascimento. A face B do 78 rotações que lançou a bossa nova, o célebre “Chega de Saudade”, de 1958 trazia um baião do próprio cantor, o polêmico baiano de Juazeiro de saudosa memória, João Gilberto: “Bim bom/é só isso o meu baião/e não tem mais nada não/o meu coração pediu assim”

A Caixa “Monumento Nordestino”, essencialmente autoral, captura três faces dessa saga. Em “O rei do baião”, o eixo principal de seu legado, que se multiplicou por entonações diversas do mesmo compasso binário e influenciou gerações como: Caetano Veloso, Geraldo Vandré, Alceu Valença, Gilberto Gil, Fagner, Lenine, Chico César e Silvério Pontes, entre outros. “Na toada do xote” alia dois ritmos que também pontilharam sua obra, a começar pelo hino “Asa Branca“, de incontáveis regravações pelo Brasil e o mundo (o roqueiro escocês David Byrne mandou sua versão da música, em inglês), cujo registro original se deu sob  a rubrica de toada. Já a cadência do xote antecederia em quase três décadas o similar “reggae” jamaicano, embora não se tenha como anotar qualquer parentesco a não ser o da ancestralidade comum afro-europeia. Já em “Lua do Brasil”, evidencia-se o Gonzaga plural, capaz de adaptar-se e amoldar a seu estilo diversos gêneros regionais do país com a sabedoria musical de matuto que se apresentava de várias formas.

Gonzaga foi sempre um grande instrumentista, o que se pode sentir desde suas primeiras gravações em solo de sanfona, subindo ao céu e chamego. Mas ele deixa a parte de solo quando emerge seu lado de compositor e parte para o canto: “Quem me abriu o caminho foi o lagunense Pedro Raimundo, que cantava e tocava. Senti que meu caminho também era esse: de tocar minha viola e cantar”.

Luiz Gonzaga deixou uma descendência artística, como o saudoso Dominguinhos, Osvaldinho e toda uma geração de sanfoneiro que está atuando pelo Brasil e outros países. Abriu, também, caminhos para Jackson do Pandeiro e para os artistas nordestinos que vem para o Sul do País. Como criador e estilista, não há ninguém que se compare, até agora, àquele que é chamado até hoje de Rei do Baião. Ele voltou ao ponto de partida, a cidade de Exu, para finalmente cuidar do seu pé de serra.

Em 1945, uma cantora de coro chamada Odaleia Guedes dos Santos deu à luz um menino, no Rio de Janeiro, Gonzaga mantinha um caso há meses com a moça, que foi iniciado quando ela já estava grávida, sabendo que sua amante ia ser mãe solteira, assumiu a paternidade da criança, adotando-o e dando-lhe seu nome: Luiz Gonzaga do Nascimento Junior. O relacionamento pai e filho era muito conturbado e Gonzaguinha foi criado com os padrinhos no Rio de Janeiro.

Em 1948, Lua o Rei do Baião se casa com sua noiva pernambucana Helena Cavalcanti e o casal viveu junto até o fim da vida de Luiz. Eles não tiveram filhos biológicos, pois Helena não podia engravidar, mas adotaram uma menina a quem deram o nome de Rosa.

Importante citar que ele era Maçom e é o compositor, juntamente com Orlando Silveira, da música “Acácia Amarela”, que é tocada em várias lojas maçônicas do Brasil, iniciou-se no dia 03 de abril de 1971, na Loja Maçônica Paranapuan, Ilha do Governador – Rio de Janeiro

Luiz Gonzaga sofria com a osteoporose há muitos anos. Mas a sua causa morte foi vítima de parada cardiorrespiratória no hospital Santa Joana, na capital pernambucana, no dia 02 de agosto de 1989. Seu corpo foi velado em Juazeiro do Norte (a contragosto de Gonzaguinha, que pediu que o corpo fosse levado o mais rápido possível para Exu, irritando várias pessoas que foram ao velório e tornando Gonzaguinha “persona non grata” em Juazeiro do Norte) e posteriormente sepultado em seu município natal.

No ano de 2012, Luiz Gonzaga foi tema do carnaval da GRES Unidos da Tijuca, com o enredo “O dia em que toda realeza desembarcou na avenida para coroar o Rei Luiz do Sertão”, fazendo com que a escola ganhasse o carnaval deste respectivo ano.

E para concluir a homenagem ao grande Rei do Baião que foi Luiz Gonzaga aqui fica um verso do poeta cordelista João Firmino Cabral que disse:

Foi para muitos cantores

A fonte de inspirações

Pois muitos gravaram música

Inspirada em seus baiões

Como Benito di Paula

Que dele recebeu aula

Pra suas lindas canções.

Gravou com muitos cantores

Provando a sua humildade

Ajudou muitos colegas

Assim só plantou bondade

Por tudo que praticou

Quando partiu nos deixou

Um canteiro de saudade.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

CABRAL, João Firmino. Vida, morte e os maiores sucessos de Luiz Gonzaga o rei do baião, editora Luzeiro Ltda. São Paulo: 1989.

MÁXIMO, João Máximo. Luiz Gonzaga – 50 anos de chão. RJ: 1988.

ENCARTE: Luiz Gonzaga – Monumento Nordestino.

*Benjamin Nunes Pereira é membro da Academia Conquistense de Letras, membro da Casa da Cultura de Vitória da Conquista – Bahia, Licenciado em História, com pós-graduações em Orçamento Público e Antropologia com ênfase na cultura afro-brasileira, bancário aposentado, ex-diretor do Sindicato dos Bancários e Bacharel em Direito.

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