Por Marco Antônio Jardim
Onde? Na cidade-sorriso. Tudo mais se trata disso. De onde se quer estar. Comigo? Quando encontrei Ana Clarinha, de shorts, óculos gatinha, cabelos curtos não tão descoloridos, batom vermelho e sotaque rasgando o x, é que, por meio de todos os sentidos, compreendi. Ali estava o dessemelhante no semelhante. Era um teste, em plena sexta-feira de São Sebastião, o santo popular. Nos misturamos à celebração do dia, nosso excepcional solstício de verão, em reverências à vida num ônibus lotado sobre a ponte. Gaivotas pairavam no ar feito papel de seda, repletas da cor azul refletida no branco das penas.Diálogos ladeados pela entrada da baía, pelo mar. Por vezes nos abstínhamos de falar. Parecia silêncio também em volta. E ficávamos, taciturnos, a observar os tons de luz. Tudo tão azul e quase verde. Tão amarelo e quase cheio de mistério, de escapismo. De qualquer coisa que fugíamos, a busca de uma imagem padronizada continuava a ser: onde estamos? E além deste horizonte, quem somos? A linha aparente entre o céu e a terra. “Sempre fomos o que os homens disseram que nós éramos. Agora somos nós que vamos dizer o que somos”, diziam as linhas de um livro de Lygia fechado em minhas mãos. Não que fosse meu grito surdo, mas havia um espanto quase infantil (e mudo) ao ver aquele pico com tantos metros de altura, aquele monólito de milhões de anos, talvez feito mesmo de açúcar sobre o barro.