Minha caminhada na Olívia Flores

Por Paulo Ludovico

Tão esperado quanto chegar aos 18 anos de idade é chegar aos 50. Se, no primeiro caso, é grande a ansiedade, pela incerteza, no segundo (os 50), o sentimento é de apreensão. Eu, até, já ultrapassei a esse limite. Já completei 55 anos de idade (mais de meio século). Não sei se, a cada aniversário, o motivo é de se comemorar ou se é de desespero por estar, cada vez mais, perto da morte. E passei dos 50 de maneira completa, respeitosa, com tudo que tive direito. Ou seja, os cabelos, alem de esbranquiçados, quase não existem mais, subiram as taxas de açúcar no sangue, subiu a pressão (vou até rezar pra outras coisas continuarem no mesmo tom, subindo), o velho coração já andou reclamando etc. Um amigo de longas datas  diz sempre:

– Paulo, qualquer pessoa, tendo passado dos 40, botou o pé no chão e não sentiu dor, é porque está morto.

Chegar aos 50! Ah! Qualquer dia desses, conto uma experiência, das muitas que tive depois dos 50. O certo é que nunca economizei nas extravagâncias alimentares. Gostava (e ainda gosto, mesmo que não coma mais) de buchada com mocotó, rabada, feijoada (comidas que, pra mim, quanto mais gordas, mais saborosas). Quem vai negar o sabor quase incomparável de um pirão de cozido (e bem gordo). Agindo assim, não deu outra! É natural que as conseqüências dessas “ignorâncias gastronômicas” não se fizeram de rogadas. Há dois anos, fui corrigir efeitos (tirar as pelancas) de uma cirurgia do estômago, aquela pra emagrecer. Na mesa cirúrgica do Hospital Aliança, em Salvador (e aí foi a minha sorte), o inevitável. Uma veia entupida. O coração parou. Uma, duas, três e quatro vezes. Os médicos conseguiram fazer o danado bater de novo (claro senão, eu não estaria aqui, contando essa história!). Depois fui informado que tive a chamada pré-morte, ou seja, eu pré-morri. Começou tudo numa terça e só fui acordar na quinta-feira, pela manhã. Pra mim os dois dias não duraram mais que duas ou três horas, o tempo da cirurgia. Quando minha filha, Thaise, chegou pra me visitar na UTI cardíaca, armei-me da cara mais deformada de que fui capaz de fazer, entortei os braços e perguntei, com a voz prá lá de rouca e enrolada:

– Quem é você!!!???

Confesso que me arrependi de ter feito a brincadeira, pois ela, minha filha, é quem precisou dos atendimentos médicos da UTI, onde eu estava.

Hoje, já se passaram dois anos e não sinto qualquer problema. Nem uma “faltazinha” de ar, por menor que seja. Mudei todos os meus hábitos, aqueles, gastronômicos. Passei a me alimentar (no início a contragosto) de uma comida mais saudável. As deliciosas gorduras, nunca mais!

Eu, que sempre tive medo de médicos, me acostumei a eles. E, até sinto falta quando demora a próxima consulta (que acontece de 6 em 6 meses). Cardiologista, arritmologista, endocrinologista… São tantos que, até, perdi a conta. Só não está na minha pauta o danado do exame de próstata. Esse? Ainda não fiz! Tenho certa (e justificável) resistência.

Pois muito bem! Todos os médicos foram unânimes em sugerir-me qualquer atividade física. Uma caminhada seria uma boa pedida. Na Olívia Flores, optei. E fui.

Segunda feira (essas atitudes começam sempre nas segundas). Providenciei uma daquelas roupas de atleta (calça e camisa de malha), parei o carro em frente do antigo São Tarcísio e comecei a caminhada. Era perto de cinco da tarde. “Vou ver até onde consigo ir”, pensei. Afinal vinha de um longo período de sedentarismo. Lasquei a perna pra dentro. Em quinze minutos já estava chegando ao Inocoop I, ali, colado no Colégio Luis Eduardo. Avaliei a situação das pernas, nada de anormal. Elas estavam intactas. O coração? Batia normalmente. Continuei a caminhada, afinal, foi pra isso mesmo que estava ali. Já havia passado do Colégio Oficina, quando pensei, de novo: “ando mais cinco minutos (para completar meia hora e volto)”. Nesse momento, passa por mim, em sentido contrário, uma senhora, uma anciã, diria, até (eu indo e ela vindo). Pensei, outra vez: “ando meus cinco minutos, volto e ainda ultrapasso essa distinta senhora”. Acelerei o passo, para obter sucesso em meu intento. Ah! Seu moço. Por mais que eu andasse (já de volta), via o “alvo” ao longe. Apertei mais ainda o passo. “Agora vai, a Inês é morta”, arrisquei pensar, novamente. Já perto do Supermercado Rondelli, com o ar próprio dos vitoriosos, meu objetivo foi alcançado. Deixei a sexagenária (ou seria septa…) pra trás. Mas, logo, os efeitos do esforço (hercúleo, diga-se de passagem) se fizeram notar. As pernas começaram a adormecer e já insistiam em não me obedecer. Não se passaram nem 3 minutos, quando, percebi aqueles cabelos brancos, esvoaçantes se aproximarem perigosamente (senti-me um Rubinho Barrichello, tendo Michael Schumacher colado em sua traseira). Acho até que, em resposta a meus competitivos pensamentos e querendo se vingar, aquela senhora passou a ter também o objetivo de me ultrapassar. Seria muita humilhação (mesmo que eu estivesse em meu primeiro dia de caminhada). Ah! Esqueci de dizer que sou torcedor do Flamengo e ela trajava uma camisa do Vasco!!!!! Aquela ultrapassagem dela???!!! Só se fosse por cima de meu cadáver. Com esses fortíssimos argumentos, quase comecei a correr. Quando cheguei a cerca de vinte metros do carro, as batatas da perna (panturrilha é só as de jogador de futebol) travaram. E as duas!!. A boca já não fechava mais, numa tentativa de puxar todo o ar existente na redondeza. Literalmente, arrastando-me, consegui, num arranque final, chegar ao carro, com a mulher quase “fungando em meu cangote”. Até achei que seria bom se ali tivesse uma dessas faixas com a inscrição “CHEGADA”, que os vencedores puxam ao cruzarem a linha final. Para não cair, dobrei o corpo pra frente e escorei-me no carro (fingindo estar fazendo um alongamento, como forma de disfarçar a minha total exaustão). Mesmo todo o sofrimento, não impediu que minha fisionomia assumisse uma expressão de vitória. E isso acontecia, ainda que não mais sentisse qualquer indício de que minhas pernas existiam. As “batatas”, principalmente. Tive de esperar uns bons e longos minutos para conseguir dirigir de volta pra casa.

Hoje já se completaram dois meses de caminhadas. Tranquilo, tranquilo, ando perto de seis quilômetros, uma hora e vinte minutos, mais ou menos. Gorduras e sedentarismos, nunca mais. Agora, na Olívia, passei a me sentir um atleta de alta performance. Torço até pra encontrar, de novo, aquela senhora de cabelos brancos e lhe propor uma pequena competição.  E sabe mais? “Ela pode vir quente, que estou fervendo”


2 Respostas para “Minha caminhada na Olívia Flores”

  1. Robson Ferreira

    Bom Dia, Paulo.
    Tenho 46 anos, moro em Feira de Santana, e a 2 anos tive uma surpresa, “desagradavel” fui fazer um exame de rotina e apareceu
    uma artéria entupida. sempre tive um rotina saudavel, não bebo, não fumo, praticava exercicos, emfim a ultima coisa q puderia imaginar, era ter um problema no coração, más aconteceu. Passei 22 dias no hospital entre a vida e morte, Fiz 2 pontes de safena e uma mamaria e coloquei um marca passo, Más graças ao bom
    DEUS e sua misericordia, Tô aqui escrevendo. Minha historia é muita parecida com sua narrativa. no inicio após a cirurgia tinha muitas duvidas e medo. hoje graças ao bom DEUS tenho uma vida normal,hoje nem lembro mais do ocorrido, voltei a
    jogar bola, correr, vida sexual normal, posso até assistir os jogos do meu Vascão que não é mole para quem é cardiaco., kkk
    abçs paulo.
    Muita saúde!!!!
    Robson

  2. Rejane Messeder

    Boa Tarde Paulo

    Leio todos os “causos” que você publica, porém a caminhada na Olivia Flores ainda continua sendo a minha favorita. Dei boas gargalhadas lendo essa matéria. Abraços.
    Esperando a próxima história.

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