O “foinha” do Cine Madrigal

Paulo Ludovico

Sempre me recordo de histórias que aconteceram em minha juventude. Mesmo porque,  aproveito dessas minhas memórias pra transformar aqueles “assuscedidos” nesses causos que, ao longo desses últimos anos, venho contando neste espaço. Aqui, tenho compromisso apenas com a brincadeira, e não quero mais que isso. Claro que os casos são verdadeiros (os protagonistas estão aí para atestar), apenas coloco uma espécie de moldura, dando, ao menos no meu entender, um aspecto cômico a esses acontecimentos verídicos. É evidente que procuro também, além de relembrar de fatos passados, contar causos que retratam episódios recentes.

Vamos a um dos antigos. Uma das três séries de meu 2º Grau foi lá no velho Colégio Batista Conquistense (que funcionava onde hoje é depósito da Madeireira Real, na Siqueira Campos). Lembro-me que enchíamos o peito para dizer: CIENTÍFICO, isso para diferenciar do curso Normal. “O Curso Normal é pra mulher”, vaticinavam aqueles mais “machões”.

O Diretor do Batista era o Professor Jesiel Norberto, de saudosa memória. Todos que conviveram com ele, naqueles idos tempos do início da década de 70 (período em que estivemos juntos), são gratos pelas suas lições de honradez e de decência. Era um Colégio exemplo. Tínhamos orgulho de ser aluno daquela instituição. Lembro-me de alguns dos professores de nossa turma: dois Aloísio, Chagas e Carvalho, Dr. Sebastião Castro, do Samur, Fernando Eleodoro, entre outros. Colegas de sala, lembro-me de Mario Sérgio e da irmã, Rita (os dois, irmãos do ex-jogador de futebol, Naldo), Maria Ester das Virgens (esse sobrenome dela era motivo de inúmeras brincadeiras), Ariovaldo Fernandes (que tinha o apelido de Nem Pancinha), Paulo César Figueiredo, Stênio Bonfim (uma cara extremamente gozador, filho de Onorino do cartório) e, entre outros, Adson Vilas Boas (também de saudosa memória), que é um dos protagonistas de nossa história de hoje. Na época, tínhamos entre 14 e 17 anos de idade.

Estudávamos no período da manhã, de segunda a sexta. Mas, duas ou três vezes por semana, marcávamos para sair. Sempre programas leves. Às vezes íamos a uma lanchonete, outras nos encontrávamos na Alameda Lima Guerra (jogar conversa fora e “azarar” as meninas). Em outras, a diversão era no cinema. E foi justamente lá que aconteceu essa nossa história de hoje. Numa matinê do Cine Madrigal.

Antes, vamos falar de uma figura que respondia pela alcunha de Zé Lopes. Uma figura esquisitíssima para nós garotos da época. De estatura alta, corpo magro, trajava sempre calça e camisa pretas. Isso, sempre! Ele era o encarregado de manter a disciplina durante a exibição dos filmes. Durante aqueles tempos, colocou vários desses “bagunceiros” pra fora do Madrigal. Por sessão, eram quatro ou cinco obrigados a sair. O menino bagunçou e, logo, surgia, do nada, aquela figura aterrorizante, munida de uma lanterninha, com o foco em direção ao rosto do “malfeitor”. Era uma vergonha sair da “sala de projeções” do cinema, escoltado por Zé Lopes que, invariavelmente agarrava o “delinqüente” pelo cinto, na parte dos fundos, o que o fazia quase que flutuar, tocando irregularmente e se possível as pontas dos pés no chão. Todos aqueles de minha idade ou próximos a ela, freqüentadores das sessões de filmes do Madrigal, certamente, vão se lembrar do velho e taciturno Zé Lopes. Foi o terror de toda criança cinéfila da época. É bom que se ressalte que mais tarde, já adulto, relembrei com Zé Lopes daqueles casos do velho Madrigal e percebi que a figura aterrorizante era mais fruto de nossa imaginação.

Vamos ao causo. Três foram os seus protagonistas: Stênio Bonfim (o gozador), Adson Vilas Boas (a vítima) e Zé Lopes (o algoz).

Estávamos todos numa das matinês do Cine Madrigal (não me lembro de qual o filme. Assim também é demais, também), as luzes acabam de ser apagadas para dar início à programação. Depois dos gritos da garotada, já impaciente, vem um silêncio que um amigo sempre diz: ensurdecedor. Nesse momento, sem que ninguém esperasse, Stênio Bonfim grita, com toda a força que conseguiu extrair dos pulmões e com uma voz fanha (o chamado foinha), o seguinte:

– Né Nopes, seu Miado!!!!!!!!!

Claro que ele quis dizer: “Zé Lopes, seu viado”. E repetiu, com a voz mais foinha, ainda, totalmente nasal:

– Né Nopes, neu “miado” melho!!!!!!!!

Ele acrescentou o “velho”, só pra pirraçar, fato que deve ter enfurecido sobremaneira o destinatário do adjetivo.

Numa rapidez que nos impressionou, o ofegante Zé Lopes já aponta a terrível lanterninha em nossa direção. O primeiro sou eu. Ele detona a seguinte pergunta:

– Foi você?

Prontamente, respondo:

– Eu não, Zé Lopes.

Depois é o Nem Pancinha. A mesma pergunta, ao que obtém idêntica negativa.

O seguinte é Stênio Bonfim, autor do grito, que punha em discussão a “macheza” de Zé Lopes. O velho Stênio responde:

– Eu não, seu Zé Lopes.

Agora era o Adson Vilas Boas, que responde:

– Neu Né Nopes, não mui eu não!

Uma observação que muda toda a história: Adson era totalmente fanho, isso é, foinha, até a tampa. Imagine como a voz dele saiu.

Até hoje não me esqueço de Adson, agarrado pela parte traseira do cinto, sendo “escoltado” pra fora do Madrigal, balançando as pernas, sem conseguir colocar os pés no chão.

Que ele me perdoe. Onde estiver, receba as minhas homenagens.


3 Respostas para “O “foinha” do Cine Madrigal”

  1. Ivana Dantas

    Muito bom. Ri demais, principalmente por ter conhecido os personagens. Adoro os “causos” do Paulo Ludovico. Abraços…

  2. Adriana Lopes

    Esse Stenio Bonfim é hein!!!
    Grande imitador..

    Excelente Causo Paulo Ludovico.

  3. AMANCIO

    Olá Paulãozãozinho,grande matemático, homem capaz de escrever o nome da amada em uma calculadora, encontrei por acaso quando prucurava notícias de Candido Sales, lembro de todas os personas do Areal de Cima, tenho contato com Henrique e Rielson, OUTROS perdi contato Samuel, Gaveta,Gaia,Fernando e suas bujigangas, queria lembrar o nome do irmão ciumento. Abraço Amancio.

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