O Rebucetê Entrevista: Giácomo Mancini

Fotos: Rafael Flores | O Rebucetê
Fotos: Rafael Flores | O Rebucetê

Por AJ Oliveira e Rafael Flores | O Rebucetê

Em quase 40 anos de carreira, Giácomo Mancini, gerente de Jornalismo da Rede Bahia, viu a comunicação passar por várias fases. Quando começou, em Porto Alegre, as tecnologias eram apenas um embrião do que são hoje, chegando a trabalhar com filmes mudos e em preto e branco na produção de reportagens televisivas.  Em seu cargo atual, dialoga com diferentes gerações de jornalistas, tendo que conhecer e se adaptar a novas realidades das tecnologias de comunicação. Durante visita ao curso de Jornalismo da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, Mancini apresentou para os estudantes o trabalho realizado pela equipe da Rede Bahia, deixando claro que está atento às novas formas de se transmitir a informação. Após a conversa com os alunos, o jornalista reservou um momento para falar ao Rebucetê sobre as transformações e desafios atuais da sua profissão.

O Rebucetê: A tecnologia trouxe muitas facilidades para quem tem a missão de informar. Mas o senhor diria que também existe hoje alguma dificuldade em especial na profissão de jornalista que não existia no seu início de carreira?

Giácomo Mancini: O grande desafio hoje, onde qualquer um pode ser emissor e receptor de informação, é saber o que é notícia, por que eu estou te mandando uma notícia, por que eu estou saindo de casa fazendo uma imagenzinha do meu celular sobre uma manifestação ou sobre um buraco de rua? Então decodificar essa informação toda que está chegando pelas mídias sociais é que é o grande desafio do jornalismo atual. Parar, comparar, analisar e tabular o que interessa e o porquê desse interesse. Na televisão, o tempo do jornal continua o mesmo, o volume de imagens e de informação é cada vez maior, logo é uma questão de decodificar o que é notícia com tudo isso que chega na redação. Acredito que o que vai resolver essa dificuldade são as competências criadas dentro das escolas de jornalismo.

OR: No seu cargo na Rede Bahia, o senhor com certeza recebe muitos jornalistas que estão começando. O que o senhor acha que há de mais positivo e de mais negativo no estudante recém-formado que chega às redações hoje em dia?

GM: O positivo é o seguinte: a maioria tem ânsia de aprender. As pessoas vão para uma seleção realmente dizendo “estou disposto, quero aprender, quero fazer”. Isso é fundamental porque a partir do momento em que estamos dispostos a aprender, estamos dispostos a crescer.

Porém, ao mesmo tempo que essas pessoas estão dispostas a aprender, elas saem da faculdade achando que os mais experientes estão fora do mercado e deviam estar aposentados porque a tecnologia mudou. Todos nós que ainda estamos nesse cargo também temos competências. É evidente que uma redação boa se faz com mescla, como tudo na vida. A sua imaturidade de juventude com a minha maturidade profissional. Nós dois vamos criar um caminho diferente para uma matéria diferente, você vai ter uma visão que eu não tive, porque o meu olhar às vezes está um pouco cansado. Mas da forma de colocar aquilo no ar eu entendo. Às vezes você não sabe.

Então essa troca é fundamental, mas tem muita gente que sai da faculdade dizendo “eu tô pronto”. Ninguém tá pronto. Eu gosto de brincar que a gente aprende a vida toda, o último aprendizado que temos é a morte. Você aprende a morrer, aí acabou o aprendizado.

Então eu acho que as pessoas que estão saindo da academia só precisam dizer: “Eu tenho um mundo vasto para conhecer e quero conhecê-lo”. Aí fica mais fácil.

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OR: A mídia tradicional está atenta às mudanças na comunicação?

GM: Absolutamente. Está, com certeza. Toda hora chega uma informação nova, toda hora as mídias estão se modernizando, toda vez você tem mais tecnologia chegando… o celular é uma tecnologia, fazemos coisas bem feitas em televisão com o celular. Até filmezinho de televisão estão fazendo com o celular. A câmera fotográfica Canon 5D Mark III virou a grande câmera para se fazer filmes, séries americanas… quem pensaria nisso há dez anos? Há três alguém usaria uma máquina fotográfica para fazer um seriado americano com qualidade e competência? Tudo que está chegando, a gente está vendo. Se a gente está vendo, a gente está analisando, se está analisando, a gente está aprendendo e o que dá a gente bota no ar.

O Rebucetê: O surgimento de novos formatos, como o apropriado pelo coletivo de mídia NINJA* através de transmissão on line de manifestações ou movimentos sociais é uma afronta a audiência da mídia tradicional ou desperta uma necessidade de apropriação dessas tecnologias?

Giácomo Mancini: Não acredito que seja uma afronta , como também não acredito que exista mais essa coisa de “determinado veículo está manipulando a informação”. Não tem mais como ignorar um fato com as novas mídias, não vou entrar na discussão de mídia NINJA com vocês pois é uma questão de critério e consenso de cada um, não vou entrar no mérito do que eles fazem ou deixam de fazer. Mas independente do nome que possa levar isso é inevitável. Isso tem que acontecer e isso vai acontecer, o problema é como a gente vai tratar disso. Não só eu que trabalho com televisão aberta, como vocês estudantes, pra verificar que tipo de emissão essas pessoas querem dar em determinados assuntos e em determinados eventos e que interesse tem nisso também.

A partir dessas mudanças de tecnologia pra cá, além daquelas velhas perguntinhas que o professor faz pros estudantes de jornalismo quando vão fazer matéria: Onde, Como, Quando e Por que, entrou um fato fundamental  que as pessoas não se dão conta as vezes: Quem está emitindo aquilo por interesse, quem tá sendo beneficiado, quem quer ferrar quem, quem quer mostrar o quê, entendeu?

É fantástico a gente notar que temos concorrências diferentes surgindo e admitir que ainda estamos aprendendo a lidar com ela. Tanto é que houve uma mudança significativa, não sejamos hipócritas, houve uma mudança de posicionamento de todas as emissoras do primeiro dia de manifestações para o segundo dia delas. Então reconhecemos que há quem esteja mostrando coisas que a gente não está.

Agora, independentemente de existir uma mídia que esteja transmitindo ao vivo, eu tenho que conseguir imagens pra mostrar o seguinte: Eles tem, mas a gente também tem, aí que eu tenho que ser competente pra dizer que estou cobrindo tudo e cobrindo bem. Exatamente pra evitar que se diga que cobrimos uma parte e deixamos de cobrir outra por uma questão de interesse. Mas no final das contas o fundamental é a busca pelo conteúdo e pela informação.

 


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