Ódio puro é cegueira

Foto: BLOG DO ANDERSON
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Jeremias Macário

“Estamos nos acostumando a perder o senso da vergonha”. É uma frase do protagonista do livro “Número Zero”, do escritor e intelectual Umberto Eco. A trama do romance se passa em Milão, Itália, em 1992, no tempo da “Operação Mãos Limpas” (mani pulite). Gostaria de falar de coisas amenas, mas o cenário conturbado atual brasileiro não permite. Há dois anos a população saiu pacificamente (depois houve quebra-quebra) às ruas para pedir melhorias nos transportes públicos, mais saúde e mais educação. Prometeram uma reforma política eleitoral que não deu em nada e, ainda por cima, a economia mal conduzida começou a descer ladeira abaixo. Leia mais.

  Sem gestão administrativa competente, o governo Dilma gastava mais do que tinha, inclusive com as tais pedaladas fiscais. Muitos números negativos e os escândalos foram abafados porque vinha ai uma eleição pela frente e os meios justificavam os fins para o PT se manter no poder. Depois do pleito, a panela não suportou tanta pressão e terminou por explodir.

  Com os reajustes da energia, dos combustíveis, da água e outros itens, o dragão da inflação acordou soltando fogo pelas ventas e com ele o desemprego e a desagregação social, sem contar as revelações mais escabrosas da Operação Lava Jato envolvendo o PT e os principais partidos da aliança que tudo fizeram para depenar a Petrobrás.

  O povo que elegeu a presidente se sentiu traído com as promessas de dias melhores e ai veio o ódio que foi tomando proporções ainda maiores a partir de aproveitadores e oportunistas que apenas torcem pela desgraça do governo, não importando se as consequências podem resultar numa tragédia.

  Como a maior parte dessa população é inculta e sem consciência política, esse ódio foi ainda mais instigado por gente da extrema-direita que encontraram espaço fértil para formular proposições de retrocesso político como um possível retorno dos militares ao poder, o que seria um golpe ditatorial. Esse ódio puro está virando uma cegueira.

   Na onda, muitos estampam cartazes e gritam intervenção militar, sem ao menos imaginar que num regime de repressão eles não mais teriam o direito de se manifestar e de se expressão; de não mais xingar os governos e políticos nos botequins e bares da vida; de não mais realizarem reuniões sem permissão e até mesmo de reivindicar salários e melhorias trabalhistas.

  Com o ódio pelo ódio irracional, na maior parte, no lugar do mais saúde, mais educação, mais segurança, reforma política, fim da doação de campanhas eleitorais, moralização do Congresso e corrupção zero, entrou com mais força a palavra impeachment (70%). Outra vez, a maioria não tem noção de como se dá o processo, nem os motivos que resultar no seu encaminhamento. A acusação precisa de base jurídica fundamentada com provas e leva tempo. Muitos terminam se sentindo iludidos.

   Se sair um impeachment assume o vice, Michel Temer, mas se houver uma ação condenatória por abuso de poder econômico nas eleições pelo Tribunal Superior Eleitoral, entra o presidente da Câmara, Eduardo Cunha que tem 90 dias para marcar novas eleições. A Câmara não pode entrar com o pedido de afastamento só com base nas manifestações das ruas.

  Por ser menos doloroso, já que se quer a saída de Dilma, não seria mais objetivo pressionar para que ela renuncie ao cargo por má gestão e por ter ocultado fatos comprometedores durante a campanha eleitoral? O PT e seus coligados estão se autodestruindo. Basta observar que os ratos já estão deixando o barco.

  O perigo é que esse ódio pode levar à insensatez e gerar uma tragédia, sem levar em conta que os oportunistas citados em atos de corrupção estão aproveitando para alimentar a raiva na sede de acabar de uma vez com as investigações do Ministério Público e da Polícia Federal. Eles, que foram colocados lá pelo próprio PT, agora querem mesmo é jogar uma camada fina de asfalto nessa lama da corrupção.

 A advocacia Geral da União acabou de entrar com uma ação junto ao Tribunal Superior Federal para invalidar provas contra o presidente da Câmara na Operação Lava Jato, quando a Casa tem o dever de apoiar as investigações.

   As manifestações de rua deveriam prestar uma homenagem de apoio a este juiz Sérgio Moro que, com coragem, tem conduzido as investigações neste turbilhão de acontecimentos. O ódio não pode ser maior que a luta contínua para que essa investigação siga até o seu fim e o Brasil seja passado a limpo. Não se pode perder esse foco de vista, mesmo que a nação troque de comando. Os lobos viraram mansos cordeiros.

   O próprio Fernando Collor de Melo chamou o Procurador Geral de filho da puta na Tribuna do Senado e o presidente da Câmara espumou de raiva ao ser citado que recebeu cinco milhões de reais de propinas de empreiteiras. O Bolsonaro pede intervenção militar e a bancada da bala reza na cartilha da ditadura.

  Por outro lado, temos um Congresso Nacional conservador e desmoralizado que está usando esse ódio para se safar das sujeiras e empurrar “pautas bombas” para ver a bagaceira. O povo não pode se iludir com esses falsos salvadores da pátria. Tem mais que vigiar atentamente os desvios desse Congresso, exigindo o fim das corrupções e que todos culpados sejam punidos.

  Não se pode perder de vista que o Congresso e muitos políticos safados sempre foram traidores de nossas esperanças e não merecem confiança. É preciso muito discernimento e saber separar o joio do trigo nessa hora para que não caiamos em outra esparrela de movimentos escusos, suspeitos e monitorados por testas de ferro, filhotes, simpáticos e frutos da ditadura militar que nos massacrou durante mais de 20 anos.


Uma Resposta para “Ódio puro é cegueira”

  1. ISRAEL PEREIRA ANDRADE

    O melhor vai acontecer – Todos(MP,TCU políticos) a favor da presidente dilma.Melhor é continuar no ritimo da corrupção vigente e desgoverno total.Rumo ao “bolivarianismo” venezuelano!.De outra forma ocorrerá uma TRAGÉDIA(). SERÁ().

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