Academia do Papo

                         Paulo Pires (*)

As últimas de Cansadinho 

 Encontrei-me com o amigo e filósofo Carlos Cansadinho no Costinhas Bar.  Brindamos o encontro com a efusividade de sempre.  Estava com dois amigos e rapidamente me convidou para acompanhá-los no copo e no papo. Claro que não pensei duas vezes. Sentei-me com calma e o garçom me mandou logo uma dose dupla de whisky nos peitos. Entrou igual faca em melancia.

Como fui o ultimo a chegar, fiquei atento ao que conversavam os três. De entrada não gostei muito porque percebi que falavam de trabalho. Declaro que a palavra trabalho hoje é um vocábulo que me provoca urticária. Principalmente em mesa de bar. Nesses lugares, procuro sempre falar de amenidades, coisas fúteis, inúteis e que traduzam apenas os ideais de uma vida que poderia ter sido o que não foi.

 

            Cansadinho me pareceu muito à vontade. Estávamos quase na entrada dos sanitários e, inevitavelmente, acompanhávamos o entra e sai do pessoal indo ao toalete. Claro que os nossos olhares sempre se concentravam nas moças. Os rapazes não nos interessavam (de minha parte asseguro isso). Moças lindas, jovens, simpáticas, algumas nos cumprimentaram, outras nos olhavam com indiferença. Tudo bem.

 

            A noite avançava e diante daquele vai-e-vem Cansadinho resolveu esboçar suas avançadíssimas teorias sobre a vida. Surpreendentemente e depois de se certificar que todos estavam atentos ao seu discurso, abriu a angular do seu olhar matreiro e lançou a seguinte tese: “A coisa mais fácil do mundo é passar uma mulher para trás e a mais difícil [e penosa] é passar ela prá frente”. Um dos amigos que estava com o copo na boca, deu uma gargalhada tão explosiva que acabou jogando cerveja em todos que estávamos na mesa. Depois que as coisas se assentaram, voltamos à normalidade e chegamos a conclusão que a coisa é realmente séria. Claro que não se trata apenas da mulher. Conheço algumas mulheres que estão doidas prá darem um “zignal” em seus companheiros-mala, mas, confessam: Tá difícil. Os caras não desgrudam delas. Acho que uma das maiores decepções que uma mulher tem é quando descobrem que o seu companheiro é mala. E como tem mala por aí. Alguns desses são tão desgraçados que prometem matar a mulher e filho ou filhos se ela o largar. Anteontem em São Paulo um desses jogou o menino e depois se jogou do 18º andar. Ô mala!

 

             Cansadinho ficou alegre ao observar que sua tese fora bem aceita. Tornou a nos olhar e perguntou se conhecíamos um argumento sobre “as vidas” postulado por Gabriel Garcia Marques, o grande escritor colombiano. Um dos amigos perguntou: Que postulado? De imediato ele respondeu: A de que quase todos os homens tem três tipos de vida. A primeira é a vida privada, a segunda é a vida pública e a terceira a vida secreta. Dissemos que não sabíamos. Então ele explicou a idéia do colombiano: A vida privada está vinculada às relações dos seres humanos no seio da família, em meio aos amigos, etc.etc. Na vida pública você tem relações com o  trabalho, escolas, clubes, ambientes públicos, etc. etc. Dito isso, observou-nos fixamente com o seu olhar 43, suspirou e argumentou: “Mas é na vida secreta, onde o homem mais se compraz”. É esta a vida, disse o filósofo, a mais prazerosa de todas. O sujeito mantém dentro de si a satisfação de fazer coisas que todos reprovariam, mas ele faz porque é secreto e ninguém está sabendo. E acrescentou: “Quer saber se isso é verdade? Observem bem: Por trás de um grande homem há sempre uma grande mulher e atrás desta, a mulher que ele realmente gosta”.  Antes de Cansadinho dizer isto, o mesmo sujeito que nos jogou cerveja anteriormente, parou com o copo que ia levando à boca, evitando assim que tomássemos mais um banho. Isso não impediu, entretanto, de ele estourar uma risada que chamou atenção de todos que estavam em Costinhas.   Até nosso amigo Costinhas sorriu á distância.

 

            Cansadinho sentiu que o discurso estava agradando. Olhou-nos mais uma vez com toda matreirice e sugeriu que procurássemos fazer uma reflexão sobre o que acabara de dizer. Nesse momento uma moça, dessas capazes de fazer o barbeiro amolar a navalha na língua do freguês, como diz McDonald, ficou em frente à porta do toalete aguardando sua vez. Era uma mulher prá ninguém botar defeito. Não me atrevo a descrever o biotipo para não cometer nenhuma injustiça com a “máquina”. Resumindo: Era um avião ou como diria o poeta Cabral de Melo: Uma pantera. Olhamos para ela de cima abaixo e concluímos que era coisa de primeiro mundo (como diz nosso amigo Bozó). Ela, totalmente indiferente aos nossos olhares, mostrou-se enigmática até a chegada de um sujeito que pela cara deveria ser mais velho que todos nós.  O sorriso que ela endereçou prá ele, foi suficiente para entendermos que o cara devia ter uma  “grana violenta”.  Cansadinho avaliou o quadro e cheio de inveja (nós também) disse o seguinte: “É, meus amigos, tá mais que provado: Quem gosta de “taca” é viado. Mulher gosta mesmo é de dinheiro”. Apesar de ser uma frase batida, sorrimos e caímos na gargalhada. Foi uma agradável noite de filosofia, cachaça, música, mulher e poesia. A vida é bela. Cordiais saudações e até a próxima.


Uma Resposta para “Academia do Papo”

  1. Alex Pereira

    Cansadinho é irrecuperavel!. VIVA O CANSADINHO!.

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