A marca da foice

Jorge MaiaJorge Maia

Eu era menino, e não faz muito tempo, quando ajudava meu pai em seu pequeno comércio de material de alumínio e ferragens em geral. Ali aprendi coisas do cotidiano, a exemplo de fazer certas contas de modo  rápido, claro que a repetição era a aliada para fixar na memória o preço de uma unidade, um dúzia, uma grosa ou uma resma. Hoje são palavras pouco ouvidas, exceção feita à palavra  dúzia.

Naquele tempo, em contato com clientes e representantes, aprendi a conhecer as marcas e tipos de ferramentas  destinadas  ao trabalho rural. Sabia decorado o nome das marcas de machado, facões, enxadas, facas e foices, dentre tantas marcas e tipos. O facão preferido era o “Collins” cujo logotipo era uma mão segurando a ferramenta, daí o homem do campo procurar pelo facão ” marca mão”.  Aqueles mais letrados procuravam pelo facão ” Colinos”, confundiam a pasta dental com o facão.

Havia, outras marcas: tupy, tramontina e sesam. As marcas de foices que eram mais procuradas eram: Tupy, laranjal, chamada por muitos de laranjada, Mas a foice escolhida era preferencialmente aquela de marca ” duas caras”. Era a melhor. De produção originada de fundição inglesa, conquistou o trabalhador rural, e de fato era a melhor. A marca era representada por duas caras unidas, olhando em sentidos contrários.

Sábado era o grande dia para atender ao pessoal do campo, e eu me  sentia senhor da situação, pois conhecia todas as marcas e tipos e sabia atender muito bem às pessoas da zona rural, pois sempre me afinei com aquela gente simples que às vezes contava tantas histórias.

Um belo sábado, mania de dizer belo isto ou belo aquilo, quando algo chama a nossa atenção, quando um cidadão do campo, compenetrado, entrou na loja e disse: quero uma foice marca político. Eu não sabia do que se tratava, ferido em minha vaidade pessoal por conhecer todas as marcas e tipos, rendi-me à minha ignorância e disse que não tínhamos aquela marca, que eu não a conhecia e perguntei quem fabricava e como era o tipo da foice.

O homem sorriu e disse: você vende a foice marca político, eu estou vendo ela ali, apontou em direção à foice “Duas Caras” e eu disse: mas esta é “Duas Caras”, ao que ele respondeu isso mesmo, igual aos políticos.

Aquilo foi uma lição daquele homem simples do campo, que trazia uma concepção sobre o político, então verifiquei  que tudo isso é mais velho do que eu pensava. Passados os anos, tomei conhecimento que aquela marca ainda está no mercado. VC 090814


Uma Resposta para “A marca da foice”

  1. Josilene

    Trágico. A solução é o dilúvio.

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